Pular para o conteúdo principal

Patologia das construções: noções básicas para arquitetos e estudantes de arquitetura


Texto: Alcilia Afonso

Para saber mais:
AFONSO, Alcilia. Conservar já! Documentar sempre. Patologias da tectônica da modernidade arquitetônica. Estudo de caso em Campina Grande. PB. Salvador: 13º Seminário Docomomo Brasil.2019.



Esta postagem tratará sobre noções básicas que um arquiteto, ou estudante de arquitetura deve possuir sobre patologias das construções- um tema bastante presente na atuação profissional. Trabalha para tanto, baseada em autores que trataram sobre o tema e são referências na área, além de se apoiar nas normas da ABNT e nos documentos produzidos pelo ICOMOS.

No final da mesma, encontra-se uma listagem de referências bibliográficas que deve ser consultada para um maior aprofundamento.

Esclarecimentos iniciais.

SOUZA e RIPPER (1998) conceituaram patologia das construções como o campo da engenharia civil que se ocupa do estudo das origens, formas de manifestação, consequências e mecanismos de ocorrências das falhas e dos sistemas de degradação da construção.

Nesta postagem, serão utilizadas as imagens da sede da Secretaria de Cultura de Campina Grande/ SECULT- para ilustrar as colocações.


Patologias encontradas na SECULT CG: pichações, descaracterizações. 
Fonte: Fotografias de Alcilia Afonso/ Kaki. 2016.



Imagens de algumas patologias encontradas na SECULT CG: pichações, descaracterizações. 
Fonte: Fotografias de Alcilia Afonso/ Kaki. 2016.


Uma manifestação patológica acontece com a queda de desempenho precocemente (antes de se atingir o limiar de vida útil para aquele material ou componente), diante de erros no planejamento, especificação, execução e/ou mesmo em uso, que podem ou não ser cumulativos. Para se entender as patologias construtivas, se faz necessário rever os conceitos de durabilidade, vida útil, e desempenho.


Imagens de algumas patologias encontradas nas fachadas da SECULT CG: infiltrações nas platibandas, descaracterizações dos fechamentos das esquadrias.
Fonte: Fotografias de Alcilia Afonso/ Kaki. 2016.


Segundo a NBR 6118 (ABNT, 2003), durabilidade é a capacidade de a estrutura resistir às influências ambientais previstas e definidas em conjunto pelo autor do projeto estrutural e o contratante, no início dos trabalhos de elaboração do projeto. A durabilidade como a capacidade de manter em serviço e com segurança uma estrutura, durante um tempo especificado ou período de vida útil em um determinado meio ou entorno.

Para FLAUZINO e UEMOTO (1981) a vida útil de um edifício é condicionada pela vida útil de seus constituintes devendo-se, portanto ater-se para o grau de importância que cada elemento exerce sobre o sistema considerando variáveis como facilidade e custos atrelados a manutenção e/ou reposição, fatores de degradação e outros mecanismos intervenientes. 

As fases da vida útil são três: 1_ Fase de inicio de deterioração; 2_ Fase de propagação da deterioração; 3_ Colapso total: se não houver a devida manutenção.

O conceito de desempenho é definido pelos autores SOUZA e RIPPER (1998) como o comportamento em serviço (isto é, relacionado ao uso) de cada produto, ao longo de sua vida útil. Isto significa que, para que um material tenha um desempenho satisfatório, suas propriedades devem permanecer acima dos limites mínimos específicos, durante o período de vida útil.

Exemplifica-se aqui com o caso de uma estrutura: Acontece, no entanto, que as estruturas e seus materiais deterioram-se mesmo quando existe um programa de manutenção bem definido, sendo esta deterioração, no limite, irreversível. O ponto em que cada estrutura, em função da deterioração, atinge níveis de desempenho insatisfatórios, varia de acordo com o tipo de estrutura.

Algumas delas, por falhas de projeto ou de execução, já iniciam as suas vidas úteis de forma insatisfatória, enquanto outras chegam ao final de suas vidas úteis ainda mostrando um bom desempenho. Por outro lado, o fato de uma estrutura, em determinado momento, apresentar-se com desempenho insatisfatório não significa que ela esteja necessariamente condenada.

A avaliação desta situação é, talvez, o objetivo maior da patologia das construções, posto que esta seja a ocasião que requer imediata intervenção técnica, de forma que ainda seja possível reabilitar a construção como um todo (SOUZA e RIPPER, 1998).

Como a patologia pode ser influenciada pelo comportamento da estrutura em uso, pelo tempo e pelas condições de exposição, percebe-se, portanto, que há uma forte relação entre a patologia e desempenho, vida útil e durabilidade da edificação.

ATENÇÃO!

O surgimento de várias patologias ocorre em função de falhas humanas ocorridas nas quatro etapas ou fases fundamentais da vida de uma edificação.

São elas: Concepção e projeto; Controle tecnológico dos materiais; Execução / construção; Uso e manutenção.

Patologias da modernidade: um exemplo.

Durante a modernidade arquitetônica brasileira, especificamente àquela produzida no nordeste brasileiro (AFONSO, 2018), com um clima tropical, atrelado à adoção de modelos arquitetônicos plásticos empregados por puro modismo, o experimentalismo de novos materiais, com a escassez de materiais industrializados, a adoção de novas técnicas construtivas, com mãos de obra não qualificadas, trouxeram graves problemas para a conservação física das obras produzidas.

Patologias encontradas na SECULT CG: pichações, descaracterizações. 
Fonte: Fotografias de Alcilia Afonso/ Kaki. 2016.


Sem dúvida, erros projetuais ocorreram, prejudicando a obra, a partir de suas concepções e criando patologias contemporâneas devidas também, ao mau emprego de materiais, à falta de detalhamento apropriado.


Ficha de identificação de danos para diagnóstico das patologias encontradas na SECULT CG.
Fonte: Equipe de alunos formada por Carla Vanessa, Emanuel Cardins, Maria Luiza Nicácio.UFCG.PA5.


O uso do concreto armado como sistema construtivo, em pilares e vigas; a adoção de peles em paineis de venezianas de madeira, o uso de elementos vazados em cimento, ou cerâmicos; o revestimento com pastilhas, cerâmicas, pedras, vão acarretar numa tectônica própria, que necessita um conhecimento mais profundo sobre os fenômenos que causam patologias consequentes desta materialidade.
                                                   

Ficha de estudos das patologias encontradas na SECULT CG.
Fonte: Equipe de alunos formada por Carla Vanessa, Emanuel Cardins, Maria Luiza Nicácio. UFCG.PA5.



Referências bibliográficas desta postagem

AFONSO, Alcilia et al. Observações sobre as patologias do patrimônio arquitetônico moderno: análise e Reflexão da Preservação em Obra Moderna de Campina Grande, Paraíba. ICOMOS Brasil. 2º Simpósio científico. 2018.
FLAUZINO, W. D.; UEMOTO, K. L Durabilidade de materiais e componentes das edificações. In: Simpósio latino-americano de racionalização da construção e sua aplicação às habitações de interesse social, 1981, São Paulo. Anais... São Paulo: IPT, 1981. p. 203-220.
SOUZA, V. C.; RIPPER, T. Patologia, recuperação e reforço de estruturas de concreto. São Paulo: PINI, 1998.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5674: Manutenção de edificações - Procedimento. Rio de Janeiro, 1999.
______. NBR 6118: projeto de estruturas de concreto; procedimentos. Rio de Janeiro, 2003, 170 p.




Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Art Déco em Campina Grande

Texto: Alcilia Afonso Essa postagem tratará de uma breve introdução sobre o estilo Art Déco encontrado em Campina Grande, que compõe um rico acervo arquitetônico estudado por vários autores que se aprofundaram sobre o tema, como Lia Rossi(2010) e Marcus Queiroz(2008). Para quem se interessar sobre o tema, há também um artigo escrito por AFONSO e ARAÚJO(2015) que explora esta linguagem na cidade de Campina Grande. Esclarecendo o conceito: Art Déco e a protomodernidade.   A linguagem Déco foi uma tendência francesa que surgiu devido a um movimento internacional de design, destacando-se no período de 1925 a 1939, se estendendo pelas artes decorativas, arquitetura, design de interiores e desenho industrial, assim como nas artes visuais, na moda, na pintura, nas artes gráficas e cinema. Pode-se afirmar que, de certa maneira, misturou diversos estilos e movimentos, tais como, o construtivismo, o cubismo, Bauhaus, Art Nouveau, o modernismo e o futurismo.

Casa Miguel Vita, Recife. 1958: Documentação e arquitetura

Esta postagem visa socializar o material documental produzido por mim,  arquiteta, e professora Dra. Alcilia Afonso de Albuquerque e Melo, que entre 2002 a 2006, realizei minha tese doutoral no Departamento de projetos arquitetônicos da ETSAB/UPC-Barcelona,  e analisei esta obra, entre outras, para minha tese de doutorado sobre a consolidação da arquitetura moderna em Recife, nos 50 (Afonso,2006).                               Vista da fachada principal e lateral direita(nordeste). Fonte: 3D de Ivanilson Pereira 2020, baseado em redesenho em Autocad de Alcilia Afonso. 2004 . Torna-se necessário difundir tal pesquisa, considerando que recentemente, entre os dias 3 e 4 de outubro a  Casa Miguel Vita foi abruptamente demolida , nos restando agora, apenas a documentação produzida para a salvaguarda da memória arquitetônica do bem. Conclui recentemente um artigo sobre a obra a ser publicado em breve- na Revista Mnemosine, do programa de pós-graduação em história da UFCG, que fará parte de u

Raul Cirne: A presença mineira no nordeste brasileiro.

                                                             Texto: Alcília Afonso. AFONSO (2014) vem realizando pesquisas sobre o arquiteto Raul Cirne e sua atuação no nordeste brasileiro, havendo escrito artigos publicados em periódicos e em congressos sobre modernidade arquitetônica e através de tais pesquisas, levantou-se que Raul de Lagos Cirne era filho de Otto Pires Cirne e Maria de Lourdes de Lagos Cirne, e nasceu no dia 04 de agosto de 1928, em Belo Horizonte.                                                    O arquiteto em entrevista à Alcilia Afonso.BH.2013. Foto: Alcilia Afonso/2013. Graduou-se Engenheiro Arquiteto pela Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, em 1951, quando iniciou, em seguida, suas atividades como arquiteto.                    Em sua antiga prancheta de trabalho. BH.2013. Foto: Alcilia Afonso/2013. Na sua formação como arquiteto, Cirne conviveu com a implantação da linguagem moderna na ci