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OS ANTIGOS PÁTIOS FERROVIÁRIOS. O CASO DE CAMPINA GRANDE. PARAÍBA



Texto: Alcilia Afonso.


    Estação Nova de Campina Grande. Fonte: AFONSO.2017.


Para saber mais leia:

AFONSO, Alcilia. A relação da paisagem urbana com os antigos pátios ferroviários. O caso de Campina Grande. Paraíba. Gijon: XIX Jornadas Internacionales de Patrimonio Industrial – INCUNA 2017.

Esclarecimentos iniciais

A cidade de Campina Grande possui dois pátios ferroviários, vinculados ao patrimônio industrial do ciclo do algodão: o pertencente à antiga Estação (1907), e o pátio ferroviário da Estação Nova (1957). 

    Localização de  Campina Grande.PB. Fonte: MENESES,C.2016

    Pátios ferroviários de Campina Grande. Fonte: AFONSO.2017.

Ambos são preservados legalmente, contudo, vêm enfrentando problemas na conservação de seus conjuntos arquitetônicos e questionamentos referentes a problemas urbanos, conforme será visto nessa postagem.

A justificativa para se trazer o debate sobre o tema dos pátios ferroviários existentes na cidade e na região é pertinente, considerando-se o abandono pelo qual esses vêm passando por parte da política pública nacional, que não vem considerando a utilização dessa rede ferroviária e de seus conjuntos arquitetônicos nos dias atuais, encontrando-se esses, abandonados e marginalizados. 

A investigação que resultou na produção dessa postagem faz parte de uma linha existente no Grupo de pesquisa Arquitetura e Lugar, cadastrado no CNPq/ MEC e na UFCG/ Universidade Federal de Campina Grande, que está voltada para o estudo de acervos do patrimônio industrial ferroviário no território do nordeste brasileiro.

Apoia-se em uma literatura voltada para questões patrimoniais trabalhadas por CHOAY (2001), ASCHER (2010), CASTRIOTA (2009), CASARLADE (2014), KUHL (2009), ZANCHETTI (2012), entre outros autores, que se dedicam a observar as complexas relações (in)existentes entre patrimônio, acervo industrial, cidade, e memória nas cidades brasileiras.

A seguir, algumas informações básicas sobre os dois pátios ferroviários de Campina Grande, extraidas do texto de AFONSO(2017).


O PÁTIO FERROVIÁRIO DA ESTAÇÃO ANTIGA
Para atender ao transporte do algodão, foi inaugurada em 1907, o primeiro pátio ferroviário da cidade,  com a edificação da estação ferroviária em estilo eclético, construída  pela Great Western, como ponta de linha do ramal de Campina Grande, em um conjunto que faz parte do primeiro pátio ferroviário local, que atualmente pertence ao governo municipal e é protegido legalmente através de tombamento,  em 2001,  pelo IPHAEP/ Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba.  Localizada em uma área próxima ao centro, o conjunto vem sendo utilizado como "Museu do Algodão", espaços livres para feiras e eventos.

   Pátio ferroviário da Estação antiga de Campina Grande. Fonte: AFONSO.2017.

Ao analisar-se a relação da área do pátio ferroviário da Antiga Estação com a cidade, observa-se que essa apresenta uma série de problemas urbanos, tais como:

1) Uma baixa integração com o entorno e isolamento devido à concentração de espaços vazios e falta de atrativos para o próprio complexo;
2) Histórico de ocupações irregulares no entorno do pátio, gerando segregação espacial, socioeconômica e contrastes dentro da paisagem;
3) Barreiras: gabarito dos prédios entre açude e estação, muros altos ladeando áreas livres ladeadas de muros altos e grades do Museu;
4) Residências localizadas em áreas não edificantes próximas aos cursos d’água e na faixa de domínio da linha férrea;
5) Presença de atividade industrial conflitante com os demais usos;
6) Existência de áreas super adensadas no entorno.

Observa-se que por outro lado, o lugar da Antiga Estação possui potencialidades, tais como uma boa inserção na malha urbana com presença de vias arteriais e coletoras, capazes de interligar a área estudada com outras áreas da cidade; Um potencial paisagístico; Conexão regional (linha férrea) com possibilidade de reativação; A diversidade de usos (vitalidade urbana) e a proximidade com áreas centrais bem servidas de equipamentos e serviços.

O PÁTIO FERROVIÁRIO DA ESTAÇÃO NOVA.
Nos anos 50, a Rede Ferroviária Nacional/ RFN- na época, a responsável pelas atividades ferroviárias nacionais- a fim de ampliar a estrutura ferroviária e para atender às novas demandas, iniciou a construção do novo pátio ferroviário da cidade- um conjunto arquitetônico- que teve sua construção iniciada em 1957, ao construir o prédio principal, o da estação, que foi inaugurado no dia 14 de fevereiro de 1961.
      Pátio ferroviário da Estação Nova de Campina Grande. Fonte: AFONSO.2017.

O pátio ferroviário da Estação Nova é composto pelos seguintes edifícios: Edifício 1- Era usado como depósito de transbordo/ triagem- encontra-se destelhado, em estado de ruínas; Edifício 2- Edificado somente na década de 70, foi projetado para abrigar o setor de engenharia e administração/ a 8º residência de engenharia. 


Nele trabalhavam os técnicos tais como engenheiros, topógrafos, setor de segurança; Edifício 3- Edificação destinada à Estação Nova- Prédio em estilo Art Déco, onde se realizavam os embarques e desembarques de passageiros, e de pequenas mercadorias. Sediava também o sino da estação, o relógio, e o castelo do maquinista; Edifício 4- Galpão grande- galpão da via permanente; ferramentaria (trilhos, dormentes,grampos), oficina, posto de abastecimento- edifício dos mais antigos, antes mesmo da estação; Edifício 5- Depósito de via permanente.


Além dessas edificações, o conjunto é formado por uma extensa área externa, composta por duas praças (pracinha da 8º residência e a praça da rede), que serviam de locais de encontros e desencontros da sociedade campinense naqueles anos.


AFONSO (2017) que vem pesquisando sobre o lugar, escreveu que, sem dúvida, a edificação mais significativa do conjunto, trata-se do prédio onde funcionava a Estação Nova. A edificação possui linhas arquitetônicas em estilo Art Déco, com volumetria limpa e sem ornamentos, arrematada por uma torre central que possuía o relógio da Estação.



  Detalhe da porta de acessoe  painel artístico da Estação Nova de Campina          Grande. Fonte: AFONSO.2017.
Estação Nova de Campina Grande: detalhes da edificação em estilo Art Déco. Fonte: AFONSO.2017.

Desperta interesse na composição da edificação, as grades em ferro trabalhadas, com motivos Art Nouveau, além de um rico painel que tem como tema a vida na ferrovia. O interior apresenta uma solução em planta composta por apenas um pavimento, com espaços destinados ao embarque e desembarque dos passageiros e envio de remessas de mercadorias de pequeno porte.

Devido ao tratamento dado à solução do programa em planta e a adoção da volumetria em estilo Art Déco, o edifício que recebeu um tratamento diferenciado dos demais do conjunto, torna-se uma referência visual e simbólica no conjunto. Observando-se, porém, que como todo o conjunto, a edificação encontra-se em estado precário de conservação, necessitando de intervenções imediatas, a fim de evitar danos piores, dos quais a mesma já sofreu ao longo dos anos de abandono.

Atualmente, o prédio da Estação Nova e a malha ferroviária estão sob a responsabilidade do DNIT/ Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, que por força do Art. 8º da Lei 11.483, de 31 de maio de 2007, recebeu, por transferência, entre outros bens, a propriedade dos bens móveis e imóveis operacionais da extinta RFFSA. 

As áreas existentes entre estes dois pátios ferroviários vêm sendo objeto de estudos acadêmicos e técnicos municipais no sentido de buscar novos usos para estes vazios urbanos, que na cidade encontram-se de certa maneira, mal e subutilizados, sendo locais vulneráveis às ocupações irregulares.

DESCASO E ABANDONO

Os conjuntos ferroviários, integrantes do patrimônio industrial, ocupam grandes áreas na paisagem urbana, fazendo com que a preservação dos mesmos assuma papel estratégico, estando ligado à escala urbana e territorial, localizados em zonas centrais, incidindo sobre eles uma considerável pressão da especulação imobiliária. 



Infelizmente, as edificações, muitas vezes, devido ao precário estado de conservação não aguentam a demora processual, e passam por perdas naturais ou provocadas por vândalos que depenam o pouco do que resta dos elementos arquitetônicos do conjunto. Insistir na preservação e não abandonar os ideais é a meta.



BIBLIOGRAFIA SOBRE O TEMA

AFONSO, Alcilia.(2017). A relação da paisagem urbana com os antigos pátios ferroviários. O caso de Campina Grande. Paraíba. Gijon: XIX Jornadas Internacionales de Patrimonio Industrial – INCUNA.

AFONSO, Alcilia (2017). Pelas linhas do trem. Pelas linhas do tempo. O pátio ferroviário da Estação nova de Campina Grande. Belo Horizonte: A língua que habitamos.

AFONSO, Alcilia (2015). Liverpool do Brasil. Resquícios do Patrimônio industrial em Campina Grande. Proposta para novo uso de antiga estrutura industrial. XVII Jornada Internacional de Patrimônio Industrial. Espanha, Gijón: INCUNA.

ARAÚJO, Jair (2006). O algodão em Campina Grande. Uma discussão acerca dos livros didáticos na história. Campina Grande: Agenda

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