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Modernidade arquitetônica em Campina Grande e o trabalho do GRUPAL_UFCG


Texto: Alcilia Afonso/ Kaki



A modernidade arquitetônica vem sendo alvo de constantes discussões nacionais e internacionais, trabalhando com o resgate desta produção e dos arquitetos, bem como, com a requalificação arquitetônica destas obras edificadas.


São residências unifamiliares, edifícios multifamiliares e de uso misto, antigas repartições públicas, cinemas, terminais de passageiros em aeroportos, fábricas, que infelizmente não estão ainda totalmente inventariadas, protegidas legalmente, e por isso, passam por um acelerado processo de descaracterização. 


Casa moderna campinense. Desenho de autoria de Jhonnathas Lima.2017.Acervo Grupal_UFCG


O grupo de pesquisa, GRUPAL_UFCG- através da linha “História da arquitetura e da cidade moderna. FORM CG” pretende contribuir neste processo de resgate, estudando e divulgando esse acervo, propondo soluções para a sua conservação, e para tanto, dialoga com demais instituições como o IPHAN, Prefeitura Municipal de Campina Grande, DOCOMOMO Brasil (Documentação e Conservação do Movimento Moderno), ICOMOS brasil. 

O grupo trabalha apoiado em um referencial teórico proposto pelo programa de doutorado da ETSAB/ UPC de Barcelona, que tem nos livros do professor catalão Dr. Helio Piñon (1997), e da professora Dra. Teresa Rovira (2007), a sua base conceitual. 

Importante frisar ainda que, os princípios norteadores da arquitetura moderna- objeto de nossas observações arquitetônicas- são os critérios que adotam como pontos básicos: a arquitetura como volume e jogo dinâmico de planos; a tendência à abstração, à simplificação; utilização de malhas geométricas estruturantes do projeto; busca de formas dinâmicas e espaços transparentes, com o predomínio da regularidade substituindo a simetria axial acadêmica e a ausência de decoração que surge de perfeição técnica. 


A abstração e o racionalismo aparecem como critérios desta arquitetura, partindo ambos dos mesmos métodos redutivos da ciência clássica, ou seja, a decomposição de um sistema em seus elementos básicos, a caracterização de unidades elementares simples e a construção da complexidade a partir do simples. (Montaner, 2002, p. 82). 


As pesquisas realizadas utilizam fontes primárias coletadas em arquivos públicos e privados, seguindo uma listagem de obras a serem analisadas, a fim de levantar seus autores, clientes, soluções projetuais e construtivas, além das contribuições das mesmas para a construção de uma modernidade urbana.


O acervo moderno campinense. 

Casa moderna campinense. Desenho de autoria de Letícia Amorim. 2017.Acervo Grupal_UFCG

O aporte regional das discussões sobre a produção arquitetônica moderna campinense vem sendo respaldado em trabalhos elaborados por AFONSO (2006), QUEIROZ (2012), TINEM e COTRIM (2014) e demais pesquisadores que vêm investigando sobre a importância da preservação da arquitetura moderna nordestina no cenário nacional.

O acervo moderno em diversas cidades brasileiras, inclusive em Campina Grande- vem pouco a pouco, sendo destruído devido à falta de conhecimento das instituições e da comunidade, a respeito da importância do mesmo. 


Escola Normal. Projeto do arquiteto pernambucano Tertuliano Dionísio. Desenho de autoria de Levy Ferreira.2017.Acervo Grupal_UFCG

Arquitetos vindos de Recife encontraram em Campina Grande um solo fértil para desenvolverem suas propostas modernas, podendo citar aqui nomes tais como Heitor Maia Neto, Mauricio de Castro, Reginaldo Esteves, Waldeci Pinto, Paulo Vaz, Marcos Domingues, Carlos Correia Lima, Edison Lima, Augusto Reynaldo, Dílson Mota, Hélio Moreira e Ana Regina Moreira.

Augusto Reynaldo produziu um importante acervo moderno na cidade que foi estudado por pesquisadores (ALMEIDA e CARVALHO, 2010), que estão conseguindo documentar a obra desse personagem, que foi fundamental no processo de implantação da linguagem moderna em Campina Grande. 
Casa moderna campinense.Projeto do recifense Augusto Reynaldo: demolida. Desenho de autoria de Arielly Fialho. 2017.Acervo Grupal_UFCG

Por outro lado, o campinense Geraldino Duda, que ainda como desenhista, e posteriormente graduado em engenharia civil, projetou e executou as mais significativas obras modernas na cidade, e sem dúvida, é autor do maior acervo moderno residencial local. 
Casa moderna campinense. Projeto de Geraldino Duda. Desenho de autoria de Carine Ayanne.2017.Acervo Grupal_UFCG


O resgate do acervo através de pesquisas acadêmicas.

Como forma de resgatar este rico acervo campinense, o grupo de pesquisas Arquitetura e Lugar, do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFCG, vem realizando investigações através de projetos de iniciação científica como PIBIC/ Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica e PIVIC/ Programa Institucional de Voluntários de Iniciação Científica, capacitando alunos da graduação a interessarem-se e aprofundarem-se sobre o tema, e posteriormente, desenvolverem dissertações e teses científicas, contribuindo, dessa forma, com a preservação da memória arquitetônica e urbanística campinense.

O GRUPAL enfoca as pesquisas na área que relaciona arquitetura e modernidade e para tanto subdividiu suas investigações em cinco linhas de pesquisa, a saber: 1) Projeto arquitetônico e modernidade; 2) Design e modernidade; 3) Tectônica e modernidade; 4) Patrimônio industrial e modernidade; 5) Conservação e patrimônio moderno.

Todas estas linhas resgatam documentações coletadas em fontes primárias de arquivos públicos e privados, redesenhando o material de projeto como plantas baixas, de cobertura, cortes e fachadas, e reconstruindo virtualmente as obras em 3ds, quando estas foram demolidas ou se encontram em estado precário de conservação, como forma de resgatar e salvaguardar as soluções projetuais no que tange à forma, à função e às soluções construtivas destas edificações.



Entre os arquitetos estudados através de pesquisas podem-se citar profissionais da chamada “Escola do Recife” (AFONSO, 2006) que atuaram inicialmente na cidade, implantando ali a linguagem moderna, tais como Augusto Reynaldo e Heitor Maia Neto; o engenheiro e projetista Geraldino Duda; o arquiteto e urbanista Renato Azevedo; o mestre pernambucano Tertuliano Dionísio; e outros profissionais que marcaram a cidade com suas obras como o arquiteto Glauco Campelo, responsável pelo projeto da estação Rodoviária nova; e o arquiteto mineiro Raul Cirne, autor de projetos de estádios de futebol no nordeste brasileiro, entre eles o Estádio Ernani Sátyro em Campina Grande.

Para saber mais:



AFONSO, Alcilia. O trabalho do grupo de pesquisa arquitetura e lugar: Resgate da documentação da arquitetura moderna no agreste paraibano. Campina Grande. 1950-1980.Belo Horizonte: 6º seminário ibero-americano Arquitetura e Documentação.2019.



AFONSO, A. A poética da construção residencial moderna campinense. Tectônica e modernidade. Manaus: 7º DOCOMOMO Norte Nordeste. 2018. 

AFONSO, A. Arquitetura e estrutura: a obra de Raul Cirne em estádios de futebol do Piauí e da Paraíba nos anos 70. Manaus: 7º DOCOMOMO Norte Nordeste. 2018.


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